A vida no Pantanal Sul-Matogrossense não é tão romântica e simples, como as novelas um dia já mostraram nas telinhas. E os documentários da TV sobre o tema dificilmente conseguirão demonstrar como é viver entre mosquitos, abelhas assassinas, onças famintas e piranhas vorazes. E tudo isso em um lugar tão distante que, para se chegar até lá – saindo do porto de Corumbá, cidade que fica cerca de 430 km da capital Campo Grande – demora em média 12 horas de viagem, através de um barco com grandes chances de encalhar nos bancos de areia traiçoeiros, provocados pelo assoreamento do Rio Taquari.
Esse mesmo lugar não possui postos de saúde, água encanada, energia elétrica, telefone, internet, ar-condicionado e é claro, se alguma coisa der errado – você estará com grandes problemas a serem resolvidos.
E foi nesse lugar – a região do Taquari – a mais inóspita região do Pantanal, que o Programa “Povo das Águas” levou a sua quarta edição deste ano (2017).
O Programa
O programa “Povo das Águas” – em atividade desde 2009 – é uma iniciativa da Prefeitura de Corumbá, cujos parceiros variam de acordo com a edição, mas geralmente oscilam entre Marinha, Exército, entidades governamentais e outras entidades não-governamentais.
O programa visa levar atendimento médico e odontológico à população ribeirinha, além da manutenção da carteira vacinal humana e animal, acompanhamento familiar, cadastro de pessoas, emissão de documentos, encaminhamentos e várias outras ações que de certa forma, fazem com que o ribeirinho sinta-se mais incluso socialmente.
Esta edição realizada na área do Taquari contou com uma equipe multidisciplinar – com o apoio do Exército Brasileiro, da EMBRAPA – Pantanal (que doou vacinas animais) e da Maçonaria (que doou brinquedos para as crianças ribeirinhas) além de pessoas que se voluntariaram em ajudar.
Os números do Programa “Povo das Águas” no Taquari para cinco dias de atendimento impressionam, a julgar pela pequena quantidade de pessoas envolvidas na ação – e principalmente, pela dificuldade no deslocamento entre uma localidade e outra.
Região do Taquari – o desafio de chegar lá
A equipe do Programa Social “Povo das Águas” sofreu um pouco durante essa etapa de atendimento do Programa: foram cinco os “pontos de encontro”, os locais para onde os ribeirinhos deveriam dirigir-se para receber o atendimento: Corixão, Cedrinho, Porto Figueira, Porto Sagrado, Sant’Ana e Limãozinho e Rio Negrinho.
Porém nosso navio só conseguia chegar até um certo trecho onde a navegabilidade era segura – dali em diante, todo o acesso era realizado através de lanchas de 6 metros, as famosas “voadeiras” com motores de 40Hp.
“Todo o acesso era realizado através de lanchas de 6 metros, com motor 40 Hp.”
Para se ter uma idéia das distâncias percorridas sob o sol que não deu trégua em nenhum dia, do nosso navio até o ponto de encontro mais distante – o Porto Sairú – a viagem durava cerca de 2h45 minutos só de ida, sem parar. O trecho mais curto – na Fazenda 7 Irmãos – durou cerca de 25 minutos de voadeira.
A logística também não era fácil: alguns barcos carregavam mais ou menos equipamentos (que iam desde cadeiras de dentista, remédios, vacinas, brinquedos e roupas) e em média, cerca de 4 integrantes da equipe, mais o piloteiro – todos com coletes salva-vidas e dentro das normas de segurança da navegação fluvial.
Durante esses percursos a viagem era sempre tensa – por uma série de razões: o rio nessa área é muito estreito, muitas vezes menor que a largura de uma rua (resultado do assoreamento); existem troncos gigantescos submersos na calha do rio, que podem provocar sérios acidentes caso o piloteiro não conheça a região e fique bem atento à navegação; e o medo constante da maior ameaça mortal do Pantanal: as temíveis abelhas africanas (na verdade uma espécie híbrida – que contaremos em outra matéria).
Agora vamos aos números:
- 281 pessoas receberam atendimento médico;
- 350 pessoas foram atendidas pela enfermagem;
- 150 pessoas receberam tratamento odontológico, onde foram realizados 368 procedimentos;
- 250 escovas de dente foram entregues, mediante orientação de higiene bucal;
- 82 pessoas foram vacinadas e receberam cerca de 163 doses de vacinas diversas – 48 pessoas estavam com as vacinas em dia;
- 209 crianças foram pesadas para se enquadrarem no Bolsa-Família;
- 61 cães foram vacinados;
- 513 pessoas assistiram palestras sobre planejamento familiar;
- 182 famílias foram atendidas pelo CRAS itinerante e pela Defesa Civil;
- 37 diagnósticos de vulnerabilidade foram detectados;
- 36 procedimentos especiais de saúde foram encaminhados;
- 278 cobertores foram entregues;
- 182 crianças participaram da atividade “Contação de Histórias”;
- 182 crianças receberam doces e brinquedos;
- 10 caixas de roupas para doação foram entregues;
De acordo com Elisama de Freitas Cabalhero (49), coordenadora do Programa, a ação foi um sucesso e correspondeu às expectativas:
Essa edição nós estávamos um pouco ansiosos devido à dificuldade que tem a navegação, ao acesso – então teve um pouquinho de apreensão, mas graças à Deus, tudo correu bem e pudemos trabalhar de forma tranquila. As expectativas foram muito boas em relação à todos os atendimentos – aprendemos à todas as famílias presentes, era uma estimativa de 255 famílias – nem todas compareceram – e nós sabemos do grau de dificuldade que eles têm, de chegar até o nosso atendimento – mas quem esteve presente, pode ser atendido. –
Fonte: correiodamanha.com.br