Pesquisa científica realizada pelo Programa de Pós-Graduação em Doenças Infecciosas e Parasitárias (PPGDIP) da UFMS investiga o Vírus Linfotrópico de Células T Humanas, conhecido pela sigla HTLV, entre imigrantes okinawanos e seus descendentes residentes em São Paulo.
A pesquisa está sendo conduzida pela doutoranda Larissa Melo Bandeira, juntamente com a orientadora professora Ana Rita Coimbra Motta de Castro (UFMS e Fiocruz-MS), ambas coordenadoras laboratoriais do projeto, e a doutora Silvia Naomi de Oliveira Uehara (médica infectologista-UFMS/coordenadora clínica do projeto). Tem parceria com a Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e a Associação Okinawa Kenjin do Brasil e recebe patrocínio da Fiocruz-MS e Ministério da Saúde.
Larissa explica que o HTLV é um vírus que infecta os linfócitos T, um tipo de célula de defesa que circula no sangue. “O HTLV é transmitido principalmente pela amamentação, por isso deve ser recomendado o uso de fórmulas lácteas para alimentar os filhos de mulheres portadoras do vírus. Também ocorre transmissão por relação sexual, razão pela qual é recomendado o uso de preservativos”.
Devido a atual realização de sorologia para infecção pelo HTLV, a transmissão por transfusão de sangue praticamente não ocorre mais, mas pode sim haver contágio pelo compartilhamento de objetos pérfuro-cortantes contaminados (agulhas, seringas, barbeadores, materiais de manicure).
Colônia
O sudoeste do Japão, que engloba as ilhas de Shikoku, Kyushu e Okinawa, é considerado uma área endêmica para infecção pelo HTLV. “A partir do ano de 1908 um grande número de imigrantes e descendentes okinawanos vieram para o Brasil, por isso o estudo da epidemiologia da infecção pelo HTLV em nosso país se faz necessário”, completa Larissa.
País com o maior número absoluto de indivíduos infectados pelo HTLV-1 no mundo, o Brasil tem hoje 2,5 milhões de portadores do vírus, sendo Salvador a área de maior prevalência no Brasil. Já Mato Grosso do Sul possui a terceira maior comunidade japonesa do Brasil e Campo Grande tem a segunda maior comunidade japonesa okinawana no país.
“O HTLV-1 foi descrito pela primeira vez no Brasil por Kitagawa e colaboradores, em uma comunidade residente em Campo Grande, em 1986. Em 2012, nossa equipe da UFMS, em parceria com Fiocruz-MS, Fiocruz-RJ, Associação Okinawa de Campo Grande e Associação Nipo Brasileira de Campo Grande, investigou a epidemiologia da infecção pelo HTLV entre os japoneses e seus descendentes em Campo Grande”, explica Larissa.
Nesse levantamento foi encontrada a prevalência de 6,8% de infecção pelo HTLV. “Essa taxa é considerada alta – acima de 5% – e indica que a prevalência desta infecção se mantém alta na comunidade japonesa de Campo Grande, mesmo após quase 30 anos do primeiro estudo”, diz.
No trabalho mais atual, as pessoas com resultado positivo para HTLV foram examinadas por neurologista, mas ninguém apresentou sinal de doença causada pelo vírus.
“Todos portadores foram esclarecidos sobre sua situação sorológica, principalmente a respeito das formas de transmissão, já que a maior intenção é diminuir o índice de novas infecções (taxa de incidência) nas futuras gerações, o que consequentemente reduzirá ainda mais a ocorrência da infecção na população mais jovem, visto que esta já é baixa. Como não há tratamento específico contra o vírus, a melhor forma atual para combatê-lo é evitar a transmissão para outras pessoas”, afirma a doutoranda.
Silencioso
Considerado um vírus silencioso por, na maioria dos casos, não provocar sintomas, o HTLV ataca, principalmente, a célula T humana, um tipo de linfócito importante para o sistema de defesa do organismo, o que pode causar alterações neurológicas (paralisia nos membros inferiores), no sistema imunológico (leucemia-linfoma) e alterações urológicas, na pele, nos olhos e/ou nas articulações.
Larissa explica que o sucesso do estudo, que proporcionou informação, orientação e atendimento clínico, quando necessário, aos participantes, motivou o desenvolvimento do mesmo estudo em uma amostra representativa da população Okinawana do Brasil, uma vez que a grande São Paulo compreende a maior população japonesa e okinawana do país.
Após a divulgação do projeto com palestras educativas e distribuição de panfletos com orientações sobre a infecção, como sintomas, prevenção e diagnóstico, a equipe e voluntários realizaram as coletas de dados e sangue em cinco maiores associações okinawanas de São Paulo (Casa Verde, Vila Carrão, Ipiranga, Santo André e Liberdade), no período de julho e agosto de 2017.
As coletas foram realizadas em dias de ação em saúde (Kenko Kodo), no quais foram oferecidos também aferição da pressão arterial e glicemia capilar, assim como entrega dos panfletos informativos.
Na primeira etapa do projeto, 2.149 okinawanos e descendentes voluntários participaram do estudo. “Iniciamos as análises laboratoriais no Laboratório de Imunologia Clínica da UFMS e no Instituto de Medicina Tropical de São Paulo/USP e, desde outubro, estamos dando retorno dos resultados de exame”.
De acordo com a pesquisadora, os indivíduos com resultado positivo para infecção pelo HTLV estão sendo contactados para realizar recoleta de sangue e atendimento com o neurologista João Américo Domingos, assim como o encaminhamento para consulta com médicos especialistas no Ambulatório de HTLV do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da USP, sob responsabilidade da pesquisadora Youko Nukui.
“Além de estimar a prevalência da infecção pelo HTLV na população okinawana e de seus descendentes residentes em São Paulo, faremos análise molecular dos isolados virais circulantes nesta população, para conhecimento dos subtipos virais circulantes, assim como detecção da carga proviral e níveis de citocinas dos indivíduos infectados, para estudarmos o desenvolvimento, ou não, das doenças associadas”, explica Larissa.
Mais informações sobre HTLV estão disponíveis no site: www.kenkokodo.com.br
FONTE: UFMS