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25 de abril de 2024 - 16:08

Maria Adélia Menegazzo: “Na solidão da arte”

Teórico da literatura muito conhecido no meio acadêmico, Michel Blanchot diz que aprenderíamos mais sobre a arte se intuíssemos o sentido da palavra solidão. Embora se tenha abusado demais dela, dificilmente conseguimos definir o que seja.

O senso comum afirma, inclusive, que é possível estar só, ainda que no meio de uma multidão. O que significa, então, estar só? Nada melhor para exemplificar do que a sugestão de Cecília Meireles: seja igual “ao  camelo que mastiga sua longa solidão”. Ou o impagável “estou só e socó”, de Manoel de Barros.

No entanto, Blanchot também diz que pensar na solidão não deve nos levar a respostas patéticas. Patético, segundo o étimo gregopathétikós e o latino pathéticus, diz respeito à paixão, à comoção da alma. Mas a raiz da palavra é o substantivo pathós, que significa doença.

Assim, o patético, enquanto paixão, seria uma forma de extremo sentimento. Em que medida a paixão, que é a comoção da alma, está relacionada com a solidão? Ainda é Blanchot quem  afirma: a obra é solitária, o que não significa incomunicável. Mas, sem dúvida, o leitor entra nessa solidão e partilha todos os seus sentimentos (inclusive os patéticos), assim como aquele que escreve está sujeito ao risco dessa solidão. Vai por aí. O poeta Manoel dizia preferir e precisar do silêncio. Tinha necessidade de errar na solidão, no isolamento. Qual o efeito de toda essa solidão? O que isto pode resultar em termos artísticos?

No cinema, onde a sala coletiva e escura provoca o efeito de isolamento,  rapidamente recolheria o personagem principal de “TaxiDriver”; o anjo apaixonado de “Asas do desejo”; Rick Blane, de “Casablanca”; Francesca, de “As pontes de Madison”; Justine de “Melancolia”.

Todas personagens solitárias e sem saída, pelo menos no limite das histórias narradas. Ainda posso identificar alguns momentos de solidão extrema como leitora desses seres silenciosos, começando com Drummond, que achava que a ausência era falta e descobriu que é apenas um estar em si de forma tão assimilada que ninguém pode dele roubá-la. Também está em Homero, na figura de Penélope, tecendo infinitamente sua solidão aguardando a volta de Ulisses; em Édipo, que, depois de reconhecer seu terrível destino, isola-se em Colona. Ou, ainda, em Hamlet, que põe em dúvida sua própria humanidade, sem saber também se é  possível dormir, dormir e depois sonhar.

No Paulo Honório de “São Bernardo”, de Graciliano Ramos. Ganha outra dimensão em OridesFontela e Hilda Hilst, poetisas brasileiras que viveram em literal isolamento, dissecando palavras, reduzindo-as à flor dos poros, da pele e da poesia.

Neste diálogo com a teoria, aprende-se que “escrever é entregar-se ao fascínio da ausência de tempo”, o qual só conseguimos definir quando faz parte de uma ação humana. Na ausência do tempo, o artista chega à solidão essencial, à solidão poética, aquela que lhe permite encontrar a palavra também essencial. Na música popular brasileira, teríamos um exemplo interessante dessa essencialidade, na releitura de Gilberto Gil, quando canta: “e quando escutar o samba canção – eu preciso aprender a ser só – reagir e ouvir o coração responder – eu preciso aprender a só ser”. Entre ser só e só ser, o artista tem em si todos os sonhos do mundo. O leitor, pateticamente insone, com todas as memórias da alma, partilha tanto dessa solidão  quanto de seus sonhos.

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