Histórias de vida de homens em situação de prisão foram reunidas em um único livro graças ao projeto “Quando a Boca Cala, a Palavra Fala”, realizado com custodiados da Penitenciária de Três Lagoas (PTL). Desenvolvido pelas professoras Maria Luiza Castelari e Michela Vanessa Martins, que ministram aulas na unidade penal, o livro conta a experiência de reeducandos que tiveram suas vidas mudadas através da educação.
O lançamento do livro “1ª Antologia Autobiográfica: Quando a Boca Cala, a Palavra Fala” foi realizado, na semana passada, na sala do Tribunal do Júri no Fórum local e contou com a presença de agentes penitenciários, autoridades, professores e convidados.
A iniciativa foi realizada pela Agência Estadual de Administração do Sistema Penitenciário (Agepen), por meio do presídio, em parceria com a Secretaria Estadual de Educação, por meio da extensão – Escola Estadual Edwards Corrêa e Souza, responsável pelo ensino regular na unidade penal. A ação também contou com o apoio do Conselho da Comunidade local e do Poder Judiciário, que disponibilizaram recursos para impressão dos exemplares.
Segundo a professora Michela, o projeto foi idealizado na própria sala de aula, onde os internos começaram a escrever suas experiências, relatando suas vidas antes e depois de terem cometido os crimes que os levaram para a prisão. “Esse projeto só foi possível, porque os próprios custodiados se dispuseram a escrever relatando suas experiências de vida e tivemos amplo apoio de todos os colaboradores”, agradeceu.
Com uso de pseudônimos, a obra reúne o depoimento de quatro reeducandos, que foram selecionados e revisados pelas idealizadoras do projeto. A capa do livro foi escolhida por meio de concurso realizado entre os próprios alunos.
Um dos custodiados que participou do projeto, reforçou que teve sua vida transformada pela educação. “A minha história está escrita nestas páginas. Já passei por muitas dificuldades e problemas durante todos esses anos. Mas foi quando me matriculei na escola que comecei a refletir nos meus atos, e então mudei minha forma de ver as coisas e o conhecimento me transformou, minha ficha disciplinar melhorou muito”, garantiu o interno, agradecendo as professoras por terem acreditado no potencial de cada aluno.
Durante o lançamento do livro, o juiz corregedor das unidades prisionais, Rodrigo Pedrini Marcos, reforçou o excelente trabalho realizado pelos custodiados através dos convênios, que abrangem tanto o regime semiaberto quanto o fechado.
Dentre as ocupações produtivas do presídio de regime fechado citadas são a horta hidropônica que atende o consumo interno e doações a entidades filantrópicas; montagem de prendedores de roupa, costura de bolas e confecção de uniformes para os alunos da rede municipal de ensino, através de uma ONG.
Já no regime semiaberto são os reeducandos que fazem a manutenção de áreas verdes da cidade, mediante convênio com a Prefeitura Municipal de Três Lagoas, entre outras atividades.
Conforme o magistrado, a maior importância dessas ações é a ressocialização. “Proporcionando ao custodiado uma perspectiva de ter a sua vida transformada através da reinserção na sociedade”, destacou Pedrini, ressaltando que os índices de violência em Três Lagoas tiveram uma diminuição considerável graças à atuação das forças de segurança pública que desenvolvem atividades integradas com o objetivo de elucidar os crimes, e o tribunal de justiça faz o seu papel aplicando as penas adequadas aos diferentes crimes.
O que começou apenas como um incentivo a praticar a escrita, com a produção de textos eficientes e uma forma de exercitar a capacidade de expressar sentimentos e opiniões, acabou se tornando algo muito mais profundo e significativo. Os próprios estudantes sugeriram a elaboração da autobiografia, onde seria exposto toda a realidade vivida e sofrida pelos mesmos, deixando no final um “aconselhamento” aos leitores, sobre como não se aproximar do mundo da criminalidade. O projeto aconteceu diariamente, em períodos estipulados e sob orientação das professoras.
Para o presidente do Conselho da Comunidade, José Rodrigues, foi uma oportunidade única participar de um projeto como esse, que proporcionou chances para o próprio custodiado relatar sua história de vida em um livro. Em discurso, José Rodrigues parabenizou as professoras e os custodiados escritores, e lançou um desafio aos gestores das unidades prisionais. “O Conselho da Comunidade está aí para ajudar. Elaborem os projetos e apresentem para nós, que juntamente com os membros do Poder Judiciário vamos buscar os recursos”, informou.
O diretor da Penitenciária de Três Lagoas, Raul Augusto Aparecido Sá Ramalho, enalteceu o projeto desenvolvido reafirmando que atitudes como essa fazem a diferença no dia a dia da unidade penal. “Estamos fazendo o melhor com o que temos, e tudo isso graças ao empenho de todos os servidores, professores e administradores da Agepen. Também agradecemos ao Conselho da Comunidade e aos membros do Poder Judiciário, pelo apoio e parceria”, disse.
Representando a direção da Agepen durante o encontro, a chefe da Divisão de Educação, Rita de Cássia Argolo Fonseca, ressaltou que somente a educação e o conhecimento podem transformar vidas. “A importância de proporcionar que um reeducando tenha sua história relatada em um livro é fundamental tanto para a autoestima, quanto para a ressocialização efetiva dessa pessoa na comunidade; todos estão de parabéns”, finalizou.
Ao final, os internos escreveram dedicatórias nos exemplares das pessoas que participaram do lançamento, dentre eles, autoridades, policiais militares e agentes penitenciários.
Texto: Tatyane Santinoni e Marcos Francisco da Silva (PTL)
Fotos: Divulgação
Fonte: Site da Sejusp