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19 de abril de 2024 - 01:21

Festival de Inverno de Bonito: um outro olhar em sua história

 Kelvin Jacques Vargas

 

Vou contar a história de como um garoto aprendeu o que é arte. Essa história vai mostrar como ele descobriu as artes plásticas, a fotografia, a música, o teatro, o cinema e o artesanato.

Ele nasceu em uma pequena e linda cidade chamada Bonito, que fica no interior do estado de Mato Grosso do Sul em um país ainda mais lindo, quase perfeito, chamado Brasil. No início do século XXI um evento pouco pretensioso, denominado Festival de Inverno de Bonito, começou em sua cidade, com a intenção de promover o turismo desse lindo lugar. Havia diversos eventos e atividades culturais nesse festival, tais como: teatros, shows, cinema, exposições de fotografias, pinturas, desenhos, esculturas, lançamento de livros, entre outros.

Esse evento transformava toda a cidade, pois em todos os lugares havia informações e programações sobre os teatros, filmes e exposições. Havia apresentações teatrais em todas as escolas e nos bairros distantes, praticamente todos os que ali habitavam ficavam imersos em toda a magia proporcionada pelo evento.

No decorrer dos anos e com a evolução do festival, esse garoto, que gostava de ouvir e ver histórias, passou a assistir aos eventos como cinema e os teatros de rua que eram realizados na praça da cidade. Foi então que se apaixonou pela sétima arte, o cinema: nunca se esqueceu do primeiro filme que viu em uma grandiosa tela de cinema ao ar livre. O filme era “Tainá – uma Aventura na Amazônia”, ele viu também o filme “Meu Tio Matou um Cara”, que fez com que ele ficasse intrigado, pois o titulo dava a ideia de um assassinato, e ele se perguntou: será mesmo que eles deveriam passar esse filme e deixar as crianças assistirem? E com muita curiosidade foi vê-lo e percebeu que era uma simples comédia.

Esse garoto se apaixonou também pelos teatros ao ar livre, pois havia teatros educativos voltados para as crianças. Quando assistia às apresentações, dava muitas risadas. Nunca se esqueceu de preservar a natureza com os teatros da Fundação Brasil Bonito, uma fundação da sua cidade – que sempre se apresentavam nesses festivais –. Tinham peças voltadas à educação e à preservação da história de sua cidade e do meio ambiente, porque Bonito é muito conhecida exatamente por ter águas límpidas e cristalinas. Nunca se esqueceu de ter visto até alguns monólogos (nos quais não entendia quase nada), ter visto palhaços, malabaristas, contorcionistas, tudo isso por toda a cidade. Lembra até mesmo que via atores conhecidos na TV, com Sérgio Mamberti, que ele assistia no Castelo Rá-Tim-Bum. Da vez que ele o viu, ficou encarando aquele ator, imaginando se era ele mesmo e no que estaria pensando.

Com o passar dos anos esse garoto aprendeu a apreciar as artes plásticas, mas só aprendeu porque ele entrava em todos os salões no qual eram exibidos pinturas, fotografias e esculturas. Fazia questão de ver tudo, todas as obras, de artistas consagrados no estado e no Brasil, que eram expostas nos salões, decorados em algumas ocasiões com folhas secas e que espalhavam seu cheiro por todo o salão. Ele não tinha pretensão de entender exatamente o que estava diante de seus olhos, aliás, ele percebeu que nem sempre é preciso entender o que eles querem dizer com suas obras, porque às vezes não precisa ficar procurando um significado nas coisas, basta, simplesmente, aprecia-las.

O festival ensinou pra ele que existe uma relação fantástica entre o homem e o que ele produz, seja na arte ou na cultura. Com o tempo, percebeu que somente a relação do olhar para uma obra já faz com que ela seja única, pois nossos olhares carregam experiências diferentes. Temos olhares únicos.

Com o passar dos anos esse garoto cresceu e virou um rapaz apaixonado pela música em seus diversos estilos, começou então a frequentar os shows realizados nesse que já tinha se tornado um grande festival. Nunca se esqueceu de grandes apresentações de artistas como Almir Sater, Gabriel O Pensador, os três anos em que Nando Reis se apresentou, Ana Carolina, Maria Gadú, Elba Ramalho, Zé Ramalho, Alceu Valença, Guilherme Arantes, Erasmo Carlos, Rita Lee, Paula Fernandes, Lulu Santos, Seu Jorge, Criolo, O Teatro Mágico, Tulipa Ruiz, Jota Queste, Maria Rita, O Rappa, Falcão e os Loucomotivos, Titãs, Jair Rodrigues e sua filha Luciana Mello, Delinha, Renato Teixeira, Sérgio Reis, Chalana de Prata, Kalu, Chá Noise, Curumin, Zeca Baleiro, Márcio de Camillo. Também nunca se esqueceu da música clássica de abertura do Festival de Inverno de Bonito, o concerto para 2 violinos, cello, cordas & continuo em D menor de Antonio Vivaldi.

Os anos passaram mais um pouco e esse rapaz tornou-se um homem, um homem com sonhos, vontades e pretensões, como, trabalhar no festival. Ele queria deixar de ser um espectador para ser um organizador. Em 2011, cursando Filosofia, escreveu um projeto para a Fundação de Cultura do Mato Grosso do Sul, junto com seu Professor Josemar de Campos Maciel, propondo realizar no festival um Café Filosófico, em um espaço para se pensar o desenvolvimento Eco-sustentável da região em que viviam. No mesmo ano o projeto foi aceito e executado no restaurante Tapera, de um conhecido poeta de sua cidade, Antonio Carlos Silveira Soares (conhecido por ser o cozinheiro – como prefere ser chamado – de seu restaurante, idealizador do Voucher Único, Festival da Guavira, do Parque Nacional da Serra da Bodoquena e poeta bonitense). Os debates contaram com participações do trio “Ser Tão Trio”, da escritora Regina Echeverria e o versátil ator Pascoal da Conceição.

No ano seguinte, os debates ocorreram em torno do tema do próprio festival, Mitos e Lendas. Houve o lançamento do livro “A Origem de Datas e Festas”, do escritor e jornalista Marcelo Duarte (conhecido pelos livros Guia dos Curiosos). Neste mesmo ano o músico Marcelo Manzano e o jornalista Vicente Adorno apresentaram seu trabalho “Lendas e Mitos do Brasil”. Eles misturaram as histórias dos mitos com musicalidade impecável. Neste houve a participação do Professor Doutor Ricardo Pieretti, que falou sobre seu livro “Os Causos: Uma Poética Pantaneira”, no qual resgata histórias de contadores de causos da região pantaneira do estado.

Bem, o lado ruim de toda a história desse garoto é que esse festival, o qual ele teve a oportunidade de conhecer pedaços de inúmeros universos, vem perdendo seu valor, seja por parte de alguns de seus organizadores, dos gestores ou dos políticos. Perdeu sua magia e grandiosidade por influencia de interesses pessoais. O festival deixou de ter momentos voltados para crianças e se voltou quase que inteiramente para grandes shows, os quais, obviamente, não são pensados para crianças ou para ensinar alguma coisa.

O cinema virou praticamente um festival de curtas metragens que não são inúteis, mas são pouco voltados para crianças. Os teatros perderam seu incentivo e as exposições de pinturas, que na última edição do festival nem ocorreu. A população nativa de sua cidade foi praticamente esquecida, pois poucos participam do evento, pois ele parece ser feito somente, e em alguns momentos, exclusivamente para quem vem de fora.

O evento passou a ser mais concentrado em dois únicos espaços: na Praça da Liberdade e no espaço para os shows, que fica na entrada da cidade. O cinema voltado para crianças e seus pais, e as exposições de obras dos artistas de nosso estado fazem falta. O festival passou a não ir mais ao encontro das pessoas; agora elas, se querem e podem, têm que ir ao encontro do evento. O festival, que era em sua essência periférico geograficamente por estar espalhado por quase toda a cidade e ir ao encontro da periferia da mesma, tornou-se centralizado, por se concentrar nos dois locais citados acima.

No ano de 2015 algumas coisas começaram a mudar, assim observou esse homem. No início do ano observou uma preocupação com o Festival, percebeu que algumas áreas e pessoas do meio público começaram a demonstrar certa preocupação com este (que seria o 16º Festival de Inverno) e com os futuros eventos realizados na cidade.

Alguns encontros foram planejados, pelos governantes e secretários, para ouvir a população da cidade, algo que esse homem não se lembra de que já tivesse ocorrido. No primeiro encontro que demonstrava uma séria preocupação dos governantes e organizadores com a relação entre a população e o evento, nesse encontro, a população deu opinião sobre inúmeras coisas para o evento e a cidade. Esse encontro foi encerrado com muita animação e esperança de se sentir o Festival como antes.

No segundo encontro, bom, ele nem ouviu falar que teve um segundo encontro, quando ficou sabendo de algumas decisões já tomadas pelos patrocinadores. A animação foi aos poucos podada, por conta de questões políticas e de investigações (crise econômica, política e de valores no qual o pais se encontra), os principais patrocinadores deixaram de promover o evento, e algumas coisas começaram a ser pensadas com maior contenção de custos e atividades.

Não tinha muito que a cidade ou os envolvidos pudessem fazer, apenas aguardar a chegada do Festival. No meio do caminho a população foi agraciada pela primeira Feira Literária de Bonito – FLIB, um evento lindo voltado para o encontro entre as pessoas e a literatura. A FLIB deixou muitos atentos e apreensivos para o que seria o Festival de Inverno daquele ano, a esperança de um bom evento voltou à tona.

Enfim chegou o festival, e durante todos os quatros dias de evento (importante resaltar que nas primeiras edições do Festival eles ocorriam em 10 dias), esse homem, escutou diversos comentários, dos críticos mais destrutivos, “Essa coisa ai é o Festival de Inverno?”, “O festival está decadente mesmo, pois só tem cantores do estado.”, “Esse festival está bem fraquinho em”; aos críticos mais construtivos, “Um dos melhores Festivais que já participei”, “Adorei a ideia dos shows serem na praça e gratuitos, assim todos tem acesso”, “As atividades em torno da cidade foram muito interessantes”.

Independente de ter sido ruim ou não, o homem percebeu inúmeras coisas que voltaram a ganhar atenção, como as crianças e a arte em suas diversas categorias. Para ele, que antes não estava esperando muito, ficou contente, principalmente por que o evento voltou a incluir as escolas, crianças e jovens da cidade com inúmeras oficinas (skate, grafite, confecção de chapéus e de livro e bonecos de animais e de dança de rua) que começaram dias antes, e as palestras e seminários voltados à população que alimenta uma preocupação com o cuidado e desenvolvimento da cidade.

Interesses diversos influenciaram desde o início até os dias de hoje esse evento, isso é um fato, pois gerou inúmeras coisas inúteis e ruins para o Desenvolvimento local. Por outro lado, coisas úteis e boas também foram geradas, já que alguns desses frutos estão sendo colhidos agora, outros serão colhidos daqui a alguns dias, meses, anos, e tais frutos precisam ser colhidos e valorizados para que possam gerar mais frutos culturais, educacionais e /ou existenciais promovendo um desenvolvimento saudável e decente de uma linda cidade chamada Bonito.

O que mais importa é perceber que o Festival de Inverno continuará a fascinar, educar, encantar, apaixonar as crianças, pela arte e cultura e, principalmente, alimentar nelas um senso de preservação da cidade onde moram. Enfim, plantar e colher frutos. É preciso dar valor aos frutos que plantamos e aos frutos que serão colhidos, pois cultura e arte só tem graça quando são valorizados com amor e dedicação.

 

Texto gerado no decorrer de quase uma década.

 

O garoto que aprendeu o que é arte.

 

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