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20 de abril de 2024 - 08:17

Austrália deve votar esta semana lei inédita obrigando plataformas digitais a pagarem por conteúdo jornalístico

Projeto de lei chega ao Parlamento e desdobramentos são acompanhados com atenção porque podem determinar os rumos do relacionamento das plataformas digitais com a indústria de mídia. Grandes grupos de mídia australianos estão em campos opostos nas negociações diretas para entrar no Google News Showcase

Por Luciana Gurgel | MediaTalks, Londres*

A disputa entre o Governo australiano e as gigantes digitais para obrigá-las a pagar às empresas jornalísticas pelo conteúdo exibido em suas plataformas vive uma etapa decisiva: a lei proposta pela administração de Scott Morrison chega ao Parlamento e pode ser votada ainda esta semana. O Comitê de Economia do Senado recomendou que a casa aprove o projeto sem emendas e o Governo que ver a lei aprovada até o dia 25.

Antes da abertura da sessão parlamentar, acontecimentos e movimentações de bastidores indicam os rumos que a história pode tomar. O mais decisivo deles foi a notícia publicada por veículos australianos e pela Reuters nesta terça-feira (15/2) sobre uma reunião em Canberra durante a qual o Partido Trabalhista, de oposição, teria decidido apoiar a regulamentação.

O apoio não foi confirmado oficialmente, mas também não foi negado. Ele é  decisivo porque o partido governamental, o Liberal, não tem maioria na casa e depende do Trabalhista para ver a lei aprovada. A notícia fortalece ainda mais a posição do Governo.

Segundo o Sydney Morning Herald, o Partido Verde também endossará o projeto no Parlamento, mas pretende apresentar emendas, incluindo exigências para que os meios de comunicação invistam as receitas obtidas por meio da nova lei em jornalismo de interesse público, e uma revisão em 12 meses para avaliar o impacto sobre as editoras menores.

Enquanto isso, intensas negociações envolvendo as plataformas, o governo e os principais grupos de mídia desenrolam-se e já produzem efeitos.

De um lado, depois de reuniões entre Morrison e os CEOs do Google e do Facebook ocorridas no fim de semana, o Governo anunciou na terça-feira a decisão de ajustar alguns itens da lei, sem no entanto alterar o espírito original.

De outro, o Google fechou acordo com uma grande organização de mídia, a Seven West, para inclui-la em seu News Showcase. E corre para fechar com outros pesos-pesados – Nine Entertainment (editora de Sydney Morning Herald e Age e proprietária da rede de TV Nine), News Corp Australia, Australian Community Media e Guardian Austrália – antes de o juiz apitar o início da partida.

Acompanhe aqui os últimos lances e entenda o que está em jogo na Austrália, que pode influenciar o relacionamento da indústria de mídia com as plataformas em todo o mundo.  Se aprovada, será a primeira vez que uma lei obrigará Google e Facebook a pagar ao vincularem-se a conteúdos jornalísticos e a informar as empresas de mídia sobre mudanças nos algoritmos que os afetem.

O enredo da novela 

Depois de uma investigação de 18 meses, a Comissão Australiana de Concorrência e Consumidores propôs em junho de 2020 um código de negociação para garantir que as empresas jornalísticas fossem remuneradas de forma justa pelo conteúdo que geram. A comissão concluiu que o desequilíbrio de poder entre as plataformas e as empresas coloca em risco a indústria de mídia.

O projeto prevê que se não houver acordo um árbitro implementará o modelo de “arbitragem de oferta final” para determinar o nível de remuneração. Pelo sistema, os dois lados colocam suas propostas sobre a mesa e o árbitro decide na hora qual a vencedora.

Violações do código, incluindo a não negociação de boa fé, seriam puníveis com multa de 10 milhões de dólares australianos ou o equivalente a 10% do faturamento anual das empresas digitais na Austrália.

As plataformas opuseram-se e chegaram a sugerir deixar o país, causando reação do primeiro-ministro. A temperatura subiu em janeiro, quando depois de um depoimento da CEO do Google na Austrália no Senado expressando a possiblidade de encerrar os serviços no país, Scott Morrison reagiu com firmeza dizendo “não responder a ameaças” e que “cabe ao país estabelecer suas próprias regras sobre coisas que se pode fazer na Austrália”.

Dias depois, em 5 de fevereiro, o Google lançou seu News Showcase e fechou acordo com algumas empresas jornalísticas, mas não conseguiu assinar com as principais.

O Facebook, também alvo da regulamentação, manteve-se reservado, mas circulam notícias de que estaria negociando acordos comerciais com empresas de mídia para inclui-las em seu Facebook News, seção de notícias dentro do aplicativo móvel que já existe nos Estados Unidos e no Reino Unido.

Costuras entre governo e plataformas para alterar o projeto de lei

O Google havia descrito a legislação como “impraticável”, mas agora se empenha no lobby para que a legislação seja ao menos amenizada, com executivos seniores conversando com Scott Morrison e com o ministro do Tesouro, Josh Frydenberg, nos últimos dias.

A gigante digital pediu uma série de mudanças. A principal é que a nova lei se aplique ao Google News Showcase e não aos resultados de busca. O Google quer também uma revisão no sistema de arbitragem. Ao Financial Times, a diretora de assuntos governamentais da empresa na Austrália parece não ter dúvidas de que a lei será aprovada, mas tenta amenizar seus impactos:

“Desde que o projeto foi lançado, em julho do ano passado, continuamos comprometidos com um código viável. As preocupações que nós e outros temos levantado consistentemente são sobre aspectos específicos do código”, disse Lucinda Longcroft. 

O Facebook manifestou-se mais uma vez declarando em um comunicado em 15/2 que a lei continua inviável e pedindo aos parlamentares que a alterassem.

Mas as conversas parecem evoluíram bem. Na segunda-feira (15/2), o ministro do Tesouro disse à imprensa australiana que a decisão de instituir a nova lei mantinha-se inalterada, e acrescentou:

“Acho que estamos muito perto de alguns acordos comerciais significativos, e isso transformará o ecossistema de mídia australiano”. 

Segundo o site Techxplore, entre as mudanças aceitas pelo Governo estaria um esclarecimento sobre o pagamento às empresas jornalísticas, em valores fixos e não por links em matérias. Em uma declaração conjunta, Frydenberger e o ministro das comunicações Paul Fletcher afirmaram que os ajustes permitem uma aplicação melhor do código, mas mantêm o espírito original.

Em entrevista à Reuters, o analista de mídia e telecomunicações Paul Budde afirmou concordar que os sinais são de que o Governo australiano e o Google estão próximos de selar a paz, o que permitiria que ao governo celebrar uma vitória e à plataforma limitar os danos ao seu negócio ao conseguir algumas concessões.

Até o think tank australiano Centro de Tecnologia responsável, que chegou a elaborar a proposta de uma rede social estatal para substituir as plataformas digitais caso elas resolvessem sair do país, está favorável à nova lei. O diretor do centro, Peter Lewis divulgou um comunicado em apoio ao novo código e afirmando que as mudanças mantém a integridade da proposta.

Seven x Nine, dois grupos de mídia em campos opostos 

Em uma vitória para o Google, a Seven West Media tornou-se a primeira grande empresa jornalística australiana a fechar um acordo de licenciamento com a plataforma. Ao fazer isso, ela separou-se das rivais News Corp e Nine Entertainment, que não assinaram contratos, preferindo apoiar a nova regulamentação que estabelecerá a arbitragem para definir os termos do pagamento na ausência de acordo direto.

A confirmação foi feita com pompa durante o comunicado de resultados financeiros da Seven, na segunda-feira (15/2). A organização,  que possui uma rede de televisão aberta e o principal jornal da cidade de Perth, disse que forneceria conteúdo para a plataforma News Showcase do Google, mas não divulgou detalhes nem os valores envolvidos. Os dois lados manifestaram-se nos elegantes termos protocolares típicos desses acordos:

“As negociações com o Google reconhecem o valor da qualidade e do jornalismo original em todo o país e, em particular, nas áreas regionais”, disse o presidente da Seven West, Kerry Stokes, em um comunicado.

“A empresa está orgulhosa de apoiar um jornalismo original, confiável e de qualidade” disse a CEO do Google na Austrália, Mel Silva. 

Com um olho no padre e outro na missa, no entanto a Seven não descartou completamente o apoio à nova lei, segundo confirmou à Reuters um porta-voz da empresa jornalística.

Nine partiu para o ataque  

Em campo oposto, a Nine Entertainment preferiu esperar pela nova lei e discorda frontalmente da forma como o Google vem conversando coma as editoras. Quando o News Showcase foi lançado na Austrália, há duas semanas, o site Mumbrella citou uma declaração amarga de uma fonte da empresa:

“Isso é o que os monopólios fazem. Eles apresentam uma oferta, na forma do Google Showcase, mas não se mostram abertos a negociar. Tem que ser tudo nos termos deles, e dessa forma não participaremos. Apoiamos a legislação que o Governo está propondo como a melhor forma de garantir um pagamento justo por nosso conteúdo.”

Na segunda-feira (15/2), Peter Costello, presidente da empresa, deu uma entrevista ao Financial Times conclamando os parlamentares a “ignorarem as ameaças do Google e a aprovarem a nova lei”. A Nine é uma organização de US$ 3,9 bilhões, dona do  Sydney Morning Herald, jornal de 190 anos, que é um dos principais do país.

Ele demonstrou apoio pleno à posição do governo de “não receber ordens do Google”, lembrando que o país decidirá o que é do interesse dos australianos sem pedir permissão à plataforma para legislar”.

Costello, um ex-vice-líder do Partido Liberal australiano, disse ao Financial Times que a regulamentação é  necessária porque o monopólio do Google no setor de buscas dava-lhe poder de barganha indevido . Ele rejeitou a ideia de que a plataforma News Showcase enfraqueceu a exigência do haver uma lei:

“Nosso ponto é muito simples: se o Google usar nosso material, eles devem pagar por isso”, disse Costello.

Um jogo apenas para os big players? 

Enquanto os grandes grupos de mídia negociam em posição vantajosa, editores menores demonstram preocupação com os riscos de saírem perdendo. Em entrevista ao Sydney Morning Herald, Eric Beecher, presidente da Private Media, que dirige o site de notícias Crikey, disse que a nova lei precisa de pequenas alterações para garantir que as editoras menores compartilhem “de forma justa e transparente” a receita dos gigantes da tecnologia.

“A legislação deve criar um apoio financeiro significativo para cerca de 100 editoras de notícias regionais e urbanas de pequeno a médio porte da Austrália, para que a vasta proporção do financiamento não acabe nos bolsos da News Corp e da Nine”, disse Beecher. 

Adam Pilhofer, ex-diretor digital do Guardian e atualmente professor da Temple University, falou ao Financial Times sobre o risco:

“Minha preocupação é que os grandes players fiquem  com todo o dinheiro. Seria uma extração de ativos por políticos e por grandes organizações de mídia ”. 

A parte do leão

Os desdobramentos na Austrália têm o potencial de transformar uma indústria que foi profundamente afetada pelas plataformas digitais nos últimos anos. Os números não mentem.

Segundo o Financial Times, quando o Google foi lançado, em 1998,  jornais e revistas eram responsáveis ​​por quase um em cada dois dólares em publicidade em todo o mundo. Em 2020, de acordo com o GroupM, as editoras respondiam por apenas 8.3% do volume de publicidade, totalizando US $ 578 bilhões.

Falta muito para o jogo ser reequilibrado, como é a intenção da comissão australiana de concorrência que elaborou as bases para a nova lei. Mas pode ser um começo.

Não é à toa que União Européia, Reino Unido e Canadá, que já deram a partida na implantação de leis para regular as plataformas digitais,  revelaram que estão observando o que acontece na Austrália como modelo a ser seguido.

(*) Luciana Gurgel,  Coordenadora editorial  do MediaTalks byJ&Cia, é jornalista brasileira radicada em Londres. Iniciou a carreira no jornal o Globo, seguindo depois para a comunicação corporativa. Em 1988 fundou a agência Publicom, junto com Aldo De Luca, que se tornou uma das maiores empresas do setor no Brasil e em 2016 foi adquirida pela WeberShandwick (IPG Group). Mudou-se para o Reino Unido e passou a colaborar com veículos brasileiros, atuando como correspondente do canal MyNews e colunista semanal do Jornalistas&Cia / Portal do Jornalistas, no qual assina uma coluna semanal sobre tendências no mundo do jornalismo e da comunicação. É membro da FPA (Foreign Press Association). 

 

 

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