Priscila Arraes Reino, representante em MS do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, aponta polêmicas em projeto que tornará mais difícil a obtenção de aposentadorias e do BPC
As alterações nas regras para concessão de aposentadorias no país, defendidas como prioridade pelo governo do presidente Jair Bolsonaro, têm gerado muitas dúvidas entre os setores da população que estão a caminho de pleitear o benefício como para quem já é contribuinte do INSS (Instituto Nacional do Seguro Social). A advogada trabalhista Priscila Arraes Reino, representante em Mato Grosso do Sul do Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário, aponta itens no texto a ser remetido para o Congresso Nacional que seriam “preocupantes”, sobretudo para quem se aposentou por invalidez, trabalhadores rurais e quem recebe o BPC (Benefício de Prestação Continuada).
Convidada do Bom Dia Campo Grande nesta segunda-feira (25), Priscila detalhou aos microfones da Educativa 104.7 FM alguns aspectos da reforma da previdência. No caso das aposentadorias por invalidez, ela afirma que a proposta do governo federal prevê a concessão de benefício de forma integral para quem sofreu acidente de trabalho ou doença ocupacional, mas cria obstáculos para quem tiver uma patologia sem relação com a atividade laboral.
“No novo cálculo diminui para doenças comuns, degenerativas, graves, que recebem 60% do benefício se trabalharem por no mínimo 20 anos, depois soma 2% ao ano para chegar aos 100%. Mas para isso tem de ter trabalhado os 40 anos. É inviável isso”, considerou ela, apontando que o desemprego e as deficiências na saúde pública fazem com que um aposentado que hoje recebe entre R$ 2 mil e R$ 3 mil passaria a ganhar salário mínimo. “Como fazer frente às necessidades dessa pessoa?”, emendou citando medicações não fornecidas pela rede pública e outras despesas.
BPC
Quanto ao BPC, a mudança reduz a idade para recebimento do auxílio previsto na Loas (Lei Orgânica de Assistência Social) de 65 para 60 anos. No entanto, também abaixa o valor de um salário mínimo para R$ 400 em todo esse espectro. Se por um lado passa a atender pessoas mais cedo, deixa de ajudar pessoas de 65 a 70 anos com o salário mínimo. “É muita gente, e são pessoas idosas, assim consideradas pelo Estatuto do Idoso”, disse Priscila, lembrando que muitos desses idosos trabalharam a vida toda sem recolher benefício previdenciário ou atuado na informalidade e, desta forma “não conseguem fazer economia” para ingressar na Previdência Social.
Aposentadoria Rural
Da mesma forma, a concessão de aposentadoria rural promete gerar polêmicas. Na entrevista, a advogada lembrou que é exigida hoje uma carência de 15 anos do trabalhador rural, período o qual deve ser comprovado que atuou pela sua subsistência e para venda da produção. Com a reforma da previdência, o trabalhador rural terá de comprovar um recolhimento anual de R$ 600 –ou R$ 50 por mês.
“Pode parecer pouco para quem trabalha no urbano, mas não para o rural. Isso pode gerar um êxodo, gente vindo da área rural para a urbana trazendo vários problemas. E 70% da produção nacional agrícola vêm da economia familiar”, pontuou. Na atividade rural, também foi igualada na proposta a idade mínima para homens e mulheres se aposentarem, aos 60 anos –como ocorre com os professores. Além do desgaste físico causado pela atividade rural, Priscila lembra que as mulheres que atuam no campo são, ainda responsáveis pelas famílias. “Tem uma desigualdade”.
Professores
Ela também fez um adendo sobre as professoras de Ensino Fundamental e Médio, que passam a se aposentar com 60 anos, depois de atuar 30 em sala de aula. Neste caso, destacou-se o desgaste emocional –inclusive com problemas psiquiátricos– para as profissionais, gerando a incapacitação.
Transição
Priscila Reino ainda avaliou que o período de transição para se chegar às novas regras é muito curto. Para as atuais vigentes, de 62 anos para concessão às mulheres e de 65 para os homens, são três instrumentos progressivos, de forma até 2037 não haja, por exemplo, diferenciação no tempo de aposentadoria entre homens e mulheres.
Sobre uma delas, ela citou para pessoas que estejam há dois anos de se aposentaria –com 30 anos de contribuição para mulheres e 35 para homens– já começam a aplicação de uma contribuição equivalente a 50% do tempo para se pleitear o benefício. “Uma mulher com 28 anos de contribuição para se aposentar daqui a dois anos teria de trabalhar mais 50% do tempo, ou seja, três anos, e o homem, que tem de trabalhar 35 anos, se tiver contribuído por 33 também”.
O alerta, porém, é que o tempo para aposentadoria será alterado durante a transição, mas a mudança de cálculo por tempod e contribuição será imediata. Hoje, na contabilização dos anos de pagamento à Previdência, são excluídas 20% das menores contribuições para o cálculo da média aritmética do valor. Com a reforma, a conta envolverá todos os valores desde junho de 1994.
“Isso significa baixa do valor. Pega as menores (contribuições) que não pegava antes, vai fazer o cálculo da média e apontar 60%”.
Constituição
Priscila Reino lembra que o projeto do governo federal pretende tirar da Constituição as regras para concessão de aposentadoria, permitindo que futuras alterações envolvendo a mudança da longevidade não dependam mais de uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição, que exige aprovação de três quintos do parlamento para ser aplicada), tornando mais simples as novas modificações.
“É o ponto de vista do governo, mas temos de pensar do ponto de vista do segurado. Qual a segurança jurídica dele para se programar? Não vai conseguir, não vai saber quando vai se aposentar. Hoje tem uma regra de contribuição por idade, uma previsão e como tem regras específicas na Constiuição, ficando mais tranquilo”, disse.
“Se tira da Constituição e passa a aprovar por lei complementar, deixa de ter quorum de três quintos. Significa que pode haver mudança a todo o tempo. Isso é arriscado em um país como o nosso, com muitas emendas”, emendou. A advogada reforçou que o Instituto Brasileiro de Direito Previdenciário procura apresentar um projeto alternativo. “Entendemos que a reforma é necessária, ninguém discute isso. O que precisar ter em mente é que somos um país grande, com diferenças, desigualdades salariais, muita gente na informalidade. Não podemos tratar todo mundo igualmente”.
Sintonize – Com produção de Lívia Machado e Rose Rodrigues, e apresentação de Maristela Cantadori e Anderson Barão, o Bom Dia Campo Grande traz informações relevantes para o seu dia a dia, com um noticiário completo e entrevistas sobre temas diversos. O programa vai ao ar de segunda a sexta-feira, das 7h às 8h, na Educativa 104.7 FM, podendo ser acompanhado também pelo Portal da Educativa.